sexta-feira, 28 de maio de 2010

“Se Roma existe, é por seus homens e seus hábitos.”



O verso acima está na abertura do Quinto Livro da obra mais famosa de Cícero, “Da República”, escrito no ano 51 a.C. O verso é de Ênio, poeta do período da República Romana e após a citação Cícero escreve: “A brevidade e a verdade desse verso fazem com que seja, para mim, um verdadeiro oráculo. Com efeito: sem nossas instituições antigas, sem nossas tradições venerandas, sem nossos singulares heróis, teria sido impossível aos mais ilustres cidadãos fundar e manter, durante tão longo tempo, o império de nossa República.”

Talvez esteja aí o primeiro ponto de reflexão para quem sonha viver em uma cidade melhor. Vivemos aguardando um bom prefeito para tirar nossa cidade do marasmo num passe de mágica. Estamos sempre na esperança de que um homem dará jeito nesta cidade. Enquanto isso invejamos o crescimento de cidades vizinhas aguardando as próximas eleições, já que ainda não foi desta vez que o sopro novo de vida chegou. Tem sido sempre assim.

O verso acima pode ajudar a sair da letargia que temos vivido e enxergar o óbvio: a situação que vivemos é conseqüência de nossos homens e de nossos hábitos. Se quisermos algo melhor a obviedade é a mesma: uma nova São Gonçalo virá somente através de seus homens e de seus hábitos. Uma cidade melhor para nossos filhos e netos nunca se tornará realidade se não se levantarem homens com outros hábitos, que se orgulhem de seu torrão natal, que fortaleçam nossas instituições e zelem por nossas melhores tradições. O veneno paralisante de uma cidade é a omissão de seus melhores homens, de seus filhos ilustres. É o que tem ocorrido aqui.

Razões até não faltam, sou obrigado a concordar. Compreendo que pessoas capazes e preparadas, se achem desanimadas e desiludidas com nossa politicagem (que é diferente de Política). Quantos poderiam estar colaborando de maneira ativa com nossa cidade disputando cargos públicos, se envolvendo na Política? Mas são tantos os escândalos, tanta corrupção, tanta incapacidade que se tornou mais cômodo repetir o que propala o senso comum: "Detesto a política", "políticos são todos iguais", “não compensa envolver”.

Pessoas capazes e qualificadas estão acomodadas no recesso do lar, receosos de serem taxados pelos amigos e parentes como loucos, se ousam manifestar o desejo de disputar eleições. Quantas pessoas competentes e bem sucedidas você conhece que estão marginalizadas, excluídas da vida política, das tomadas de decisões? Quantos se desiludem a tentar se eleger por ter que se sujeitar às “práticas consagradas” de se angariar votos, que todos conhecemos?

Eu até arrisco dizer que temos bons políticos. Minoria, mas temos. Creio, pessoalmente, nas boas disposições e intenções do atual prefeito, por exemplo. E isto nos leva ao segundo ponto de reflexão.

Não basta um bom prefeito. Sozinho ninguém faz nada. É imprescindível também nos libertarmos de nossa condição de dependência. Temos o hábito de sempre esperar algo que venha de alguém “de cima”. Trabalhamos para eleger o prefeito de acordo como nossos interesses pessoais, estes dependem dos vereadores e dos deputados, que dependem do número de votos obtidos na cidade para nos mandar algumas migalhas solenemente anunciadas. É um círculo vicioso miserável e egoísta que vem corroendo nosso município privilegiando poucos e quase sempre os mesmos.

Aliás, o hábito é antigo. Desde 1500 temos alguém “lá de cima” que manda. Se hoje Portugal não nos manda mais suas caravelas recheadas de novidades, temos novos colares e espelhinhos religiosamente enviados pelos nossos políticos: a bolsa escola, a bolsa família, o vale gás, as cotas nas universidades. De vez em quando um deputado escolhido pelos nossos caciques locais, manda um dinheirinho para o hospital, uma verbinha para um novo posto de saúde, um asfaltinho acolá, auxílio isso, auxílio aquilo, que milagrosamente aumentam em anos eleitorais. E o que deveria ser obrigação (não pagamos impostos?) se torna um favor imensurável. A vida segue, eles se enriquecem cada vez mais e nós continuamos a trocar nossa dignidade por sacos de cimento e promessas de empregos ao Messias da vez. E ainda soltamos foguetes para comemorar!

Até quando? Como mudar estes hábitos? Este mês tive a oportunidade de testemunhar o entusiasmo contagiante de um grupo de pessoas com um propósito: melhorar nossa cidade. Mais do que pedir algo, a idéia desta vez é diferente e inteligente: mudar nossa forma de pensar. Pensar diferente, conscientizar primeiro para depois agir, movidos por uma frase: TODOS POR SÃO GONÇALO.

É previsível que vão aparecer os que julgam o movimento utópico, os que preferem ignorar e os que gostam de desprezar e zombar, achando, como sempre, que não vai dar em nada. Mas muitos já abraçaram a idéia com entusiasmo e a primeira ação será tentar fortalecer o comércio local. Reuniões estão sendo realizadas na ACISGON, faixas foram distribuídas pela cidade e uma palestra a cargo do Sebrae foi realizada, com a presença de mais de 500 pessoas.

Sabemos quão difícil é a empreitada, mas aquele encontro no Umuarama Clube mostrou que quando um grupo toma consciência de que algo precisa ser feito e busca o auxilio de quem sabe ensinar com planejamento, habilidade e competência, tudo começa a caminhar. Ficou claro naquele dia que a garra, vontade e emoção do cidadão, aliadas ao apoio didático e racional do Sebrae é um começo mais do que promissor. Se também se engajarem nestas ações o prefeito, os vereadores e demais políticos de forma desinteressada e buscando apenas o bem comum, o que é promissor se tornará realidade.

Ao contrário de aguardar passivamente o tão sonhado prefeito salvador que irá transformar nossa cidade todos assumem esta tarefa juntos. Isto é cidadania. O fato de ser cidadão garante a nós o direito, a possibilidade de participar ativamente da vida e do governo da cidade que nós escolhemos.

Se você se identifica com tudo o que leu até aqui, o convite é para você. Se envolva neste mutirão por São Gonçalo. Venha participar das reuniões, venha dar sua contribuição. Vamos planejar como legítimos cidadãos, cobrar ações de nossos políticos e buscar soluções realistas para nossa cidade.

Ficar em casa criticando e conformado, apenas repetindo que os políticos são todos corruptos, que não fazem nada pelo povo, que visam seus próprios interesses, não vai resolver nada. Tampouco dizer que não me envolvo porque não me simpatizo com fulano ou sicrano que participa das reuniões. Isto é também um hábito a ser mudado. Saber conviver com as diferenças e os diferentes é exigência natural da sociedade. Nenhum homem é uma ilha, muito menos perfeita. Vamos agir, vamos nos organizar. O movimento não é político e não é apenas dos comerciantes locais. É de todos. De todos os são-gonçalenses, os natos e os de coração.

Franck T. Lenzi

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