Tenho uma amiga, vamos dizer assim,que
sempre me faz refletir sobre o amor. Você conhece alguém que está sempre à
procura de alguém, de um amor ? Esta minha amiga é assim.
Teve uma carreira bem sucedida, na
empresa que trabalhou toda a vida, até se aposentar. Anualmente, recebe uma passagem de avião, para
viajar, para qualquer lugar do país. Com esta brincadeira, e suas 80 primaveras,
já conheceu todo o país e parece gostar muito da brincadeira.
Quando criança a via muito animada,
sempre em vistas de um novo amor, que estava para acontecer. Por diversas vezes
compartilhei com ela dias de espera, para ir ao encontro do novo pretendente.
Passava o dia todo se preparando, para à noitinha ir, muito bem arrumada, até a
esquina, para um novo encontro. “Moça bonita, alegre, boa conversa, quando
crescer quero me parecer com ela!” Pensava eu. Presenciei, por diversas vezes,
aquela empolgação, em vistas da possibilidade de um novo amor. Muito capricho ao se enfeitar para os encontros, daí para os programas de cinema,
teatro, passeios em algum clube. Coisas da época aonde os casais iam para se
conhecer e decidir pelo amor.
Há algum tempo, as coisas aconteciam assim. Os
prenúncios do amor eram vividos passo a passo. Os olhares, os toques, os
passeios de mãos dadas, os primeiros beijos, as reservas, tudo seguia um embalo compassado,
com tempo para amadurecer. Vivia-se o amor passo a passo em seu compasso.
Mas minha amiga Tel nunca passava de
seu terceiro encontro. Ia para o primeiro, segundo, no terceiro já encontrava
uma desculpa para terminar com a brincadeira.
O tempo passou, eu já casada com filhos e Tel namorando...
marcando encontro... e logo em seguida desistindo de tudo... Eu confesso que não
compreendia, porque uma moça tão bonita, tão namoradeira, com tantos
pretendentes, nunca quis se casar.
- Por que será que Tel não se casa?
Pretendentes é o que não lhe falta. Indaguei um dia.
- Você não se lembra da separação dos
pais dela, o quanto ela sofreu ao lado da mãe, presenciando tudo? Tenho a certeza
que o medo de amar se instalou no coração dela, ainda quando menina, com a
separação dos pais. Lembrou uma conhecida em comum.
- Como o mesmo fato fatídico não
traumatizou a irmã mais velha, que quis se casar, teve seus filhos e levou uma
vida normal ?
- São as coisas inexplicáveis que assistimos com o passar do tempo.
Há muito tempo que não me encontrava
com a amiga Tel, anos e anos. Pelo Natal, resolvi dar um telefonema.
- Oi Tel, como vai? Se não telefono,
você não dá notícias.
- Oi amiga, como está?( A mesma
empolgação de sempre, pensei comigo, e já foi contando tudo). Estou ótima! Estou
amando, loucamente. É um médico do exercito, que atendeu-me, outro dia, em uma emergência.
Ele é maravilhoso! Dançamos sempre. Outro dia, desfilamos juntos passando em
revista a tropa do exército. Foi maravilhoso. Senti-me uma primeira dama. Estou
nas nuvens! Meus dias estão cor de rosa! O amor é lindo!
Ao fundo tocava, com todo romantismo
que lhe é propício, Júlio Iglesias. Eu parecia vê-la, acompanhando com os
passos, do outro lado do telefone. Ao mesmo tempo pensava : ”Ainda hoje, a
mesma, agora com seus quase oitenta, e a
mesma busca do amor".
- Já faz algum tempo, que vocês estão juntos? Perguntei, um tanto desconfiada.
- Olha aqui, já saímos muitas vezes, mas
o que ele quer, e tem das outras namoradas, eu não dou.
- Não Tel? Por quê? O que é que você
vai fazer com isso, nesta altura dos acontecimentos? Será para terra comer?
- Não, isso eu não dou, não adianta.
Estava aí, o trauma que a acompanhou a
vida toda, fazendo suas restrições e pelo visto não vai ser sanado.
O resto da
conversa seguia, com a animação, de sempre e com Júlio Iglesias ao fundo.
No próximo domingo, liguei para falar
de algum assunto, que ficou pendente.
- Como vai a jovem enamorada mais feliz
do planeta Terra? Indaguei, ouvindo ao fundo Júlio Iglesias.
- Amiga, (o tom de voz havia mudado) preciso
lhe dizer uma coisa: terminei o namoro.
- Terminou? Como? O que foi que
aconteceu, você parecia tão feliz e agora está me dizendo isto.
- Meu amor tem outra. Descobri isto
esta semana. Ela é bem mais nova que eu e não tem reservas nenhuma. Estou muito
infeliz! Será que poderei encontrar outro amor?
- Nesta altura da vida, você quer um
amor com reservas ou sem reservas?
- Amiga, você bem sabe: com reservas!
- Posso lhe adiantar que será difícil,
mas como você sempre encontrou alguém, vá procurando que um dia dará certo.
A esperança é a última que morre. Duas
horas depois do corpo.
Wanda. Setembro 2012