quarta-feira, 2 de fevereiro de 2011

Mais perdido que cão em mudança




Para quem não gosta de cães os acontecimentos ocorridos neste verão a meu redor foram no mínimo impactantes.
Há alguns meses, junto com Vânia, minha filha, Cristiano, meu genro, Gú meu neto, veio morar em minha casa uma cachorra chamada Fera. O combinado, por telefone, é que a família e seus pertences viriam por alguns meses morar em casa, até concretizar a estabilidade do novo emprego do genro que viria a acontecer no final do verão. Nada se falou a respeito da Fera, mas ela estava incluída no pacote. Não sei quem ficou mais desajustada com a situação eu ou a Fera.
Fera é uma cadela não muito grande, de pelo negro, sem uma raça definida e não se pode dizer das mais bonitas. O impacto que Fera causou na redondeza foi muito frustrante. Aquela família que tinha cuidados especiais com a cachorra não percebeu ao certo o quanto ela era assustadora. As exclamações arrancadas das pessoas começou a dar a dimensão exato do quanto o animal era assustador.
Ao entrar em uma papelaria, certo dia, antecedendo à Gú seu dono alguém exclama assustado:
- Que bicho horrível, parece um morcego!
Quando Vânia aparece a pessoa desapontada tenta amenizar a exclamação dizendo
- Até que pensando bem ela não é tão feia assim. Mas já estava dito e o pior é que era verdade.
Minha cunhada, ao se deparar com aquele animal tão assustador entrando em seu estabelecimento comercial exclama:
- Que horror, de onde saiu este animal de aparência tão esquisita?
Alguém diz:- É de sua sobrinha Vânia, que mudou-se para a rua nestes dias!
Minha cunhada responde:- Vocês estão enganados, não é possível Vânia não adotaria um animal tão horrível.
E era verdade, era a própria Fera, até então acostumada com agrados da família de Gú, no apartamento onde moravam em uma cidade vizinha. Na nova situação a vida do animal virou de cabeça para baixo.
Habitava agora em um lugar bem mais espaçoso, mas que não tinha um lugar definido para si, os donos pouco lhe davam atenção por nunca estarem em casa. Você já ouviu a expressão: “Mais perdido que cachorro em mudança”? Era a própria. Se o animal pensasse pensaria:- A dona da casa não é das mais amigáveis, meus donos desapareceram, eu não tenho onde reclinar a cabeça, então vou cair no mundo. Foi o que fez Fera. Corria de um lado para outro, não sei se procurando ajeitar-se em algum lugar ou se encantada com a nova situação.
Mas “cão que muito mexe...” certo dia Fera foi atropelada por um carro. Sem perceber atingiram-lhe a parte traseira. Neste dia Fera voltou a ter a atenção com a qual estava acostumada. Mas como “bicho ruim também não morre” em pouco tempo Fera estava restabelecida. Agora mais assustada ainda, andava de um lado para outro pelas ruas da cidade.
Desprezando a ração que lhe era oferecida, Fera começou a freqüentar um “restaurante próprio”, num trailer da rua de cima. Agora já havia feito amigos e estes lhe ofereciam algo a mais que aqueles detestáveis grãos de ração.
Certo dia, inesperadamente, os pais de Cris que haviam dado o chorinho para o Gú encontraram Fera a caminho do restaurante. Era uma noite chuvosa. Este casal tem uma atenção muito especial com cachorros. Sem saber para onde Fera se dirigia, sem hesitar diante daquela situação acolheram o animal em seu carro e levaram-na para o Carmo, cidade para onde se dirigiram, a fim de passar o final de semana. Aqueles dias foram verdadeiros dias de princesa para o animal. Fera tomou banho, dormiu no meio do casal, foi acariciada, agasalhada e paparicada.
Em casa surgiram os mais variados sentimentos. Os donos pareciam querer Fera de volta. As outras pessoas diziam:
- Ela está assustando os fregueses de minha loja, que dizem não voltar mais até que esta cachorra desapareça
-Estou cansado de recolher fezes deste animal, correndo de um lado para outro em meu estabelecimento!
Realmente não sabíamos se desejávamos sua volta ou se desejávamos seu sumiço.
Domingo, à noite, estávamos todos na sala de visita, dando boas risadas com as vídeo cacetadas do Faustão, quando fomos interrompidos pela entrada agitada e saltitante de Fera. Houve um susto geral e uma interrogação no olhar de cada um. Foram quatro dias de sumiço e agora de onde estava surgindo aquele ser assustado e irrequieto?
As palavras de acolhimento foram as mais variadas:
- Fera de onde você veio?
- Deus me livre de onde saiu isso?
- Vem cá Ferinha meu amor, dá um abraço.
- Pensei que fosse ficar livre de você!
E assim foram muitas as exclamações.
Depois de alguns minutos surgem os pais de Cris dando a notícia do seqüestro e a sua justificativa. Acharam que fera estava sendo mal tratada na nova morada e que tiveram muita pena, ao vê-la na noite chuvosa, parada na esquina. Foram quatro dias de suspense.
Mas não parou por aí. Como a vida dos cães tem uma dinâmica bem mais acelerada que a dos humanos... Agora Fera já era um cão adulto. Teve seu primeiro cio sem que percebêssemos. Mas os cães da redondeza estavam atentos. Certo dia encontro, com uma cara de “estou amando”, subindo as escadas, Fera e seu primeiro parceiro. Impressionou-me a cara de felicidade do casal. O parceiro tinha uma raça definida parecia muito orgulhoso da conquista e demonstrava querer protegê-la. Eles formaram, a bem da verdade, um simpático casal. Este encontro lembrou-me um casal que sempre encontro, ela a tiracolo, com aquele garanhão de braços semi abertos e demonstrando uma vaidade sem fim, parece querer protegê-la, não sei de que. É, os animais tem mais a ver com os homens do que possamos imaginar. Também os humanos tem mais a ver com os animais do que possamos acreditar. Muitos outros cães compareceram, marcaram presença durante aquele cio. Inesperadamente, certo dia, vi minha casa invadida por uma procissão de cães de diversas raças e tamanhos. Não preciso dizer do susto que me causou. Até “Pingo”, um enorme cão de guarda, de nosso pátio tentou se fazer presente, mas não conseguiu. Os tamanhos não bateram, mas ele ficou de guarda organizando a procissão.
Depois de tudo depois do amor, fica a interrogação:
- Que surpresas teremos dentro de três meses?
- Quantos serão?
- A quem sairão?
Pois não é que, nestes dias chuvosos, Fera se põe dentro da casa de Pingo, talvez desejando atribuir-lhe a paternidade das crias e trouxe ao mundo três novos e peculiares cães. Neste exato momento já se encontram roliços e descobrindo o mundo a seu redor.
Os donos já se encontram de mudança para a cidade grande. Pouco ou nada dão de atenção para os animais. Se um já foi o bastante para assustar-me, hoje são quatro. Estamos nós aqui, com este belo presente, que certamente será oferecido, no momento da mudança.
Agora é aprender a amar os animais... Ou não.

Wanda - Janeiro de 2011





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